disse-me uma vez o meu professor de português desconfiando dos meus argumentos sobre um determinado tema que ele dera para a escrita de um texto crítico.
ignorando a frase feita e a ironia do seu tom de voz, respondi-lhe, de modo arrogante, que o meu objetivo não era encantá-lo mas sim levá-lo a ver o meu ponto de vista, mesmo que divergente do seu. não respondeu, apenas anuiu e fez aquele gesto com a mão de quem dá passagem a alguém a quem estava a obstruir o caminho. "cantei bem" e mesmo sem o encantar tive uma excelente nota
a ana conheceu a beatriz numa soalheira tarde de primavera. passeavam as duas no parque da cidade. a ana porque lá vivia e diariamente passeava o carlão. a beatriz porque veio a casa da dia débora passar uns dias na tentativa de fugir do maranhado de emoções que vivia, e procurava um local tranquilo e agradável para ler o seu livro.
o carlão decidiu aliviar a bexiga no banco onde a beatriz lia. a ana tinha-se distraído na conversa com a vizinha, a d. elisa. quando, salpicada pelo enérgico jato do carlão, a beatriz deu um guincho ao qual a beatriz reagiu, envergonhada ao som dos risinhos que a d. elisa não conseguiu conter.
a d.elisa despede-se apressada, ainda a rir. a beatriz afasta o carlão e desfaz-se em desculpas. a ana encolhe os ombros e murmura “só isto é que me faltava”, num tom desolado e desanimado.
beatriz perguntou se se podia sentar a seu lado, ana anuiu. passado alguns momentos, sem se saber como, a ana contava as suas ansiedades a beatriz enquanto afagava o pelo do carlão. a beatriz como boa ouvinte, como sempre fora, intervirá apenas para reforçar a comunicação ou pedir alguns detalhes.
o sr fernando, tio da beatriz, abeirou-se delas para perceber quem ela a jovem com quem a sobrinha conversava. mas nem foi visto. percebendo o envolvidas que estavam na conversa, afastou-se.
pouco mais de duas horas depois, aquele banco de jardim era local de risadas - a ana tinha um jeito único para por as pessoas bem dispostas. num ímpeto a ana levantou-se e exclamou: “tu precisas é de uma visitinha ao gervásio!”
“ao gervásio?!” questionou a beatriz.
“claro! salta daí.” responde a ana
e a beatriz, imbuída do bom humor que está desconhecida lhe trouxe, decidiu obedecer e saltar…e saltou em vez de caminhar.
a ana, espantada, riu e alinhou! - até o carlão tentou -, e lá foram elas a saltar sem parar ao encontro do gervásio!
acordo à hora do costume - o meu despertador vintage com ponteiros luminosos é das poucas peças que trouxe de casa dos meus pais. carrego no interruptor, mas o quarto não se ilumina. levanto-me caminho “aos apalpões”. chego à casa de banho e aqui, também, a lâmpada nega-se a sorrir. vou à primeira gaveta do móvel à entrada da cozinha, onde penso ter guardado uma lanterna – cheguei lá apenas com um incidente com o vaso do corredor e um ligeiro surfar no tapete da entrada. abro a gaveta, apalpo e encontro a dita cuja, começo a dar ao dínamo – esta é de sobrevivência e ecológica. ilumino o caminho até ao quadro elétrico. verifico e está tudo bem. será que não paguei a conta?! toina, claro que pagaste…tens débito direto dahhhh. será que tenho dinheiro na conta?! bem… penso que sim!
e assim, num ápice, caio em mim. se não há eletricidade, não há internet. não há televisão, nem rádio! como vou eu saber do mundo?! comunicar com o mundo?! eu bem sabia que devia ter resolvido a questão do telemóvel. mas estando em casa e constantemente ao computador, comunicando com todos por meios digitais, fui sempre adiando. e agora…estou isolada!
não posso sair de casa, não tenho telemóvel nem eletricidade. começo a sentir-me ansiosa. angustiada. não consigo parar de andar de um lado para o outro. estou demasiado agitada, não consigo acalmar. sinto que o mundo pode estar a desabar e eu sem nada saber! respiro fundo, tento lembrar-me do curso de meditação que fiz (e que nunca consegui aplicar no meu dia-a-dia). nada funciona. sinto-me a sufocar. apetece-me gritar mas a voz não sai. começo a sentir tremores frios. aprisiono-me nos meus braços mas a calma não chega. vou a janela, respiro profundamente, o ar “dói” ao entrar-me nas narinas. as ruas estão desertas. fecho os olhos, encosto-me a parede e deixo-me cair lentamente até me sentar no chão. fico assim, estática, até que ouço um ruído que reconheço bem: o ruido do modem quando está a ligar. voltou! estou de novo ligada ao mundo. corro para o computador, ligo-o e entro na minha rede social que me questiona: “em que está a pensar, mami?” eu, ainda emocionada, consigo apenas escrever: “atualizem-me, por favor!”
após publicar a minha mensagem, olho para o canto inferior direito do meu computador e verifico que passaram apenas 15 eternos minutos desde que acordei. 15 longos e dolorosos minutos de isolamento social!
quer dizer, tempo até tenho, mas paciência… ai que essa está com as reservas em baixo.
a culpa não é (só) tua. é tudo isto, envolto em incerteza, que consome as minhas energias.
neste cenário o teu queixume em nada ajuda, nada traz de novo ou de profícuo para melhorar a situação e, assim sendo, torna-se dispensável.
por isso, com um grande sorriso agradeço que não partilhes a tua bílis com quem tenta estar bem, finta os receios, procura passar este tempo da melhor forma, aproveitando o estar juntos com o tempo que nunca tivemos e que, quando voltarmos à normalidade - porque voltaremos, nunca teremos.
não me ligues para partilhar a tua negatividade - que é tão exagerada quanto o silicone de muitas!
confesso que nunca percebi as pessoas que preferem viver na desgraça, no lado negro da vida, no “ai, ai, ai que me dói o dedo gordo do pé”. por favor pensa, pensem, em quem está efetivamente com problemas sérios, que em muito (anos luz) superam a desgraça de ter de ficar no quentinho das suas casas. claro que pessoas como tu irritam-se pelo queixume. outras irritam-me pela desvalorização de tudo isto e pelo seu comportamento irresponsável - quiçá o problema sou eu que ando irritadiça!
arrepiam-me as pessoas que sabendo que estão doentes com este vírus usurpador e promiscuo que está sempre pronto para “saltar à espinha” da próxima vítima, se andam a pavonear por espaços comuns com uma total falta de noção cívica ou respeito pelo outro. quem raio consegue ser tão egoísta e irresponsável?! custa-me que indivíduos adultos precisem de amas (forças de segurança) para cumprir as regras dos paizinhos! (entenda-se governo). raios, mas quem educou estes energúmenos?! sim, para todos vocês, que provavelmente não me leem porque estão a passear numa praia ou num supermercado, façam-me um favor: cresçam! humanizem-se! destrumpem-se! desbolsonarem-se!
não sei se é uma boa ideia. mas a verdade é que a qualidade de uma ideia só é validada após a sua implementação. por isso vamos, por enquanto e por simpatia, assumir que poderá se uma boa ideia.
estou em casa, com a minha família nuclear (companheiro e rebentos), há 14 dias. não contactámos fisicamente com ninguém, não saímos de casa para nada. falamos, por videochamada, diariamente com a família alargada. vamos ao jardim apanhar uns raios de sol nas "ventas" sempre que possível. estou a enlouquecer. tratar de um recém-nascido (e a privação do sono que isso implica) e lidar com uma bebé de dois anos que não está a lidar nada bem com a invasão da nossa família por parte daquele pequeno ser que ocupa muito espaço, está a deixar-me sem paciência. o big brother da vida real é muito desafiante e esgotaste! a minha energia cai a pique, enquanto a deles se exponencia!
foi neste contexto que tive a ideia. a ideia simples de explicar ao papá o maravilhoso que seria se ele fosse acampar no jardim com a pequena durante a próxima semana. podiam aprender tantas coisas novas! fazer fogueiras, cozinhar no camping gás, tomar banho de mangueira ...tantas possibilidades para o desenvolvimento físico, cognitivo e emocional da pequena. estranhamente o papá não achou boa ideia. referiu uma acentuada descida da temperatura e outras coisas que mal ouvi... coisas insignificantes perante todas as potencialidades da minha proposta.
já era tarde, estávamos cansados, aconchegados no banco debaixo do alpendre com a velha manta sobre o nosso colo. num silêncio cúmplice que acariciava as nossas almas.
no meio do silêncio, com a sua voz melodiosa e aveludada ele simplesmente diz: foi tão bom, não foi?!
olho para ele, sorrio, aceno com a cabeça e encosto a minha cabeça no seu ombro.
continuamos em silêncio, relembrando, cada um nos recantos da sua memória, aquele momento de perfeita felicidade.
a minha rotina matinal é simples: acordo, vou à casa de banho, tiro um café e ligo a tv para me inteirar de como vai o mundo.
hoje não foi diferente. confesso, no entanto, que o pensamento que me assolou assim que comecei a ouvir o pivô do canal do costume foi: "oh não, um vírus outra vez!"
não nego que um vírus altamente contagioso nesta altura é uma ideia que muito me agrade, no entanto todo o alarido que se cria à sua volta é o que mais me preocupa. o medo torna as pessoas irracionais, e os meios de comunicação social, numa ânsia de conquista de audiências, alimenta de modo feroz o medo das pessoas.
também não acredito que a desvalorização dos riscos reais seja a forma adequada de atuar - como fazem ao comparar o número de mortos por gripe, cancro ou ataques cardíacos. há riscos que devem ser controlados pelo bem de todos, numa postura cívica e de saúde pública.
o equilíbrio, nesta situação como em todas, parece-me a aposta certa. e como atingir esse equilíbrio?! com informação correta e adequada - quer pelas entidades competentes, quer pelos órgãos de comunicação social, quer por cada um de nós nas nossas interações sociais.
nem seis da manhã são ainda … mas não consigo ficar mais na cama. a minha alma agita-se a cada pensamento e o meu corpo reage instintivamente. a expetativa é grande. hoje é o dia. o grande dia.
nunca pensei que fosse possível que isto acontecesse, mas a vida, essa danada, arranja sempre forma de nos surpreender.
levanto-me e vou diretamente para o duche. deixo a água quente escorregar pelo meu corpo, despertando cada centímetro de pele. a minha cabeça, graças à intensidade da água, cede àquele pequeno prazer, esquecendo tudo e deliciando-se com a sensação de leveza. agora a água a cair sobre os meus ombros, aumento a temperatura, o meu corpo reage, entregando-se depois à sensação de plena descontração.
afago a minha pele com a suave e cheirosa toalha recentemente tirada da máquina de secar. espalho o creme, após o aquecer entre as mãos, e o seu perfume espalha-se pelo meu corpo e inunda a minha mente com belas memórias.
desço e faço café, simples e intenso, o aroma que faltava para trazer lucidez a todos os pensamentos que invadem a minha mente.
agora, completamente desperta, sinto a ansiedade aproximar-se. o receio de que não aconteça, de que tudo não passe de uma confusão, de que aquele convite não seja mais do que o delírio da minha mente cansada.
o encontro estava agendado para as onze horas, numa modernidade aparentemente incompatível com a ocasião: um brunch. falta tanto que não sei o que fazer… a minha capacidade de concentração em qualquer tarefa é igual a zero. não quero pensar mais no assunto, criar expectativas… são oito horas, vou acordar a criançada e perder-me nos seus mimos e gargalhadas – excelente estratégia!
conversa aqui, miminho ali, cocegas e muita gargalhada são os ingredientes essenciais para entrar numa nuvem de amor que eclipsa todo o resto.
o mais que tudo acorda e junta-se à “festa”. inquire-me com o olhar, para saber se estou bem. aposto que ficou sem perceber a resposta…pois nem eu sei!
lá vamos nós, para o local marcado, na hora combinada.
ao chegar percorro o local com o olhar, verificando se estão todos, mas sobretudo procurando por ela. ao vê-la, imobilizo. deslumbro-me por aquele sorriso só seu. afasto os pensamentos que me dizem que é impossível, que o que vejo não passa de um oásis no deserto. continuo a caminhar na direção dela e perco-me no calor do seu abraço.
cá estamos nós em mais um dia dos namorados, um dos dias mais comerciais e menos românticos do ano.
numa perspetiva de utilidade pública - atribuindo algum valor a este dia -, a mami vai partilhar com tod@s os encalhad@s o seu best-seller “manual para iniciar relacionamentos”. como sabem a mami é especialista em estudos científicos sobre a atração entre os seres humanos (podem consultar os estudos aqui, aqui, aqui e aqui apresentados).
o manual para iniciar relacionamentos by mami é constituído por vários capítulos. hoje partilho convosco o capítulo 1 - o que fazer para iniciar um relacionamento com um desconhecido.
se seguir rigorosamente os oito passos abaixo apresentados estará garantido o início do relacionamento:
1- escolha o alvo;
2- analise o alvo – deverá fazer uma rápida avaliação exterior para compreender as suas escolhas no vestir, na alimentação, na bebida… assim poderá adequar o seu comportamento às preferências do seu alvo;
3 - consiga que o alvo lhe seja apresentado (conheça um dos seus amigos/as, a mãe/o pai, a prima/o, a vizinha…escolha o elemento mais acessível e faça com que o/a adore);
4 - mostre desinteresse quando o alvo lhe for apresentado, dê preferência aos outros elementos do grupo e nem pensar em pedir amizade ou seguir nas redes sociais! se o alvo lhe enviar um convite ou o seguir aguarde pelo menos 48h para retribuir;
5 - após conhecer o alvo faça com que ele/ela repare na vossa extrema compatibilidade – vestindo o mesmo estilo, optando pelo mesmo tipo de alimentação (carnívora, vegetariana, vegan, …), consumindo ou evitando bebidas alcoólicas – consoante a opção do alvo;
6 - após serem apresentados absorva informações essenciais (através do alvo ou da sua rede social – presencial ou virtual): religião, política, postura sobre assuntos essenciais (conflitos internacionais, subsidiariedade, ambiente, eutanásia, casamento, filhos, …) e já sabe, aproveite todas as ocasiões para mostrar que pensa como ele (em conversas de grupo, em compromissos agendados, em post nas redes sociais, em likes em páginas);
7 - quando surgir o primeiro convite para um encontro a dois, mostra-se hesitante, afinal nunca reparou bem nele/nela; aceite mostrando que o faz por simpatia;
8 - arrase na sua imagem para o encontro e dê-lhe sinais de que começa a reparar nele/nela. nesta fase “estará no papo” e você estará a dizer-lhe “podes avançar”.
parabéns o seu objetivo será atingido com sucesso e, para o manter, viverá uma farsa para o resto da vida!
penso já o ter dito anteriormente, algures neste meu aconchego das palavras: nunca tive tantas dúvidas, nem tantas certezas, como quando me tornei mãe.
as certezas dominam o campo afetivo, as dúvidas, todos os outros. o receio de tomar a decisão errada, de não fazer a coisa certa, de prejudicar aquele pequeno ser que em tudo depende de mim… rouba-me o sono e enche a minha cabeça de macaquinhos saltitantes e ruidosos.
numa das primeiras consultas com o médico de família (a catraia teria quanto muito um mês), o sr. doutor disse-me que a menina não deveria ser exposta ao sol, visto ter uma pele muito sensível. explicando que deveria, por isso, tomar vitamina d. confesso que fiquei presa na expressão “não deve ser exposta ao sol”. questionei: não deve como? nunca? nem nas horas menos nocivas? o médico foi perentório: não deve ser exposta! sendo ela um bebé de inverno, insisti: nem no verão, em que já está mais “velhinha”? novamente um seco “não”. eu que amo o sol fiquei logo de coração pequenino. mas pronto se tem de ser, que seja. tudo pelo bem da minha pequena flor.
tempos depois optei por arranjar um pediatra para a pequena. depois de muita reflexão conclui que para os primeiros tempos seria importante ter alguém especializado que a acompanhasse. quando no meio da avaliação o médico questionou se ela estava a tomar vitamina d, respondi que sim, e ele anuiu. aproveitei e contei o que foi dito pelo médico de família a propósito da exposição ao sol. o pediatra ficou em choque. depois deu-me uma seca de 10 minutos a explicar a importância dos banhos de sol defendidos e praticados nos países da américa latina e pediu-me autorização para usar este exemplo quando tivesse de recorrer a situações práticas para demonstrar aos seus alunos a falta de conhecimento de alguns médicos sobre determinadas temáticas.
concluindo: o sol dá saúde. em tempo ameno é de fazer banhos de sol nos horários mais saudáveis, ou seja, entre as 9h00 e as 10h00 ou as 17h00 e 18h00 (mais coisa menos coisa). é mesmo para dizer “é que isto de médicos, nunca fiando” e por isso, agarro-me a versão que mais me agrada e, vamos lá assumir, de sol os da américa latina percebem mais do que nós!